Cisão
Amor meu, eu quis fetalizar-te no âmago mais forte de minha maternidade e acalorar-te no mais protegido de mim, e eu não podia e não podia. Eu via o teu sangue espargir pela minha chaga e minhas mãos não bastavam para estancar: era preciso que se vertesse todo o teu sangue de menino para que o homem te nascesse: mas eu era mãe demais para suportar olhar.
Ainda que eu te empurrasse à lápide-nascedouro no morrer do amor, eu queria fetalizar-te... eu cravava as unhas no teu corpo e pedia: me põe no colo, filho meu, que eu também tenho medo de nascer, divide comigo tua placenta, comunga comigo esse pão amargo, havemos de sobreviver ao fórceps: este é o nosso corpo que é dado por Voz do Amor Maior. Será que o pássaro se desespera à primeira fina e pungente luz adentrando o mundo no seu ovo? Haveria de ser minha culpa, haveria de ser meu amor falho e parco. Haveria de ser a miséria de ser eu. Mas eu peço ao ovo que arrebente. Eu quero luz e cores. Que pulse intempestiva nas minhas mãos a eterna fremência do que vive. O que é a falta senão a saudade de uma alimento que existe e que ama minha fome?
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